No caminho de volta para a estrada onde Nelsinho aguardava com o caminhão ela parou numa birosca. Era um cubículo escuro à beira da estrada de terra, com o cheiro eterno de gordura queimada, fumo de rolo e suor. Um balcão de madeira lascada, duas mesas, e um velho de chapéu de couro dormitando no canto. Alice entrou, a sineta na porta tilintando com um som cansado.
Sem cerimônia, bateu no balcão. O dono, um homem barrigudo com um avental imundo, surgiu de trás de uma cortina.
"Um trago da boa. Um naco de carne seca. E uma cumbuca de fubá pra viagem."
Ela não sentou. Permaneceu de pé, a cesta no braço, os olhos fixos na garrafa marrom sem rótulo que o homem tirou de debaixo do balcão. Ele encheu um copo pequeno e sujo até a borda com o líquido âmbar. A carne seca, dura como sola de sapato, foi cortada com uma faca enorme e embrulhada em papel pardo. O fubá, amarelo e fininho, foi tirado do saco com uma cumbuca rachada e despejado num saco de papel amassado.
Alice pegou o copo. O cheiro da cachaça subiu, agressivo e familiar. Ela não cheirou, não hesitou. Levou à boca e despejou o conteúdo de uma vez só, sentindo o fogo descendo pela garganta, queimando o cansaço e a tensão acumulada, deixando em seu lugar um calor corajoso e anestesiado no peito. O gole de resistência. O gole do dever cumprido.
Ela tossiu apenas uma vez, baixo, e colocou o copo vazio no balcão com um clink seco. Pegou o embrulho, colocando-os com cuidado sobre as ervas em sua cesta. Depois, tirou uma nota do bolso — um valor suficiente — e a deixou sobre o balcão, ao lado da mancha úmida do copo.
"Não precisa de troco," disse, sua voz um pouco mais áspera pelo álcool.
O homem barrigudo apenas assentiu, os olhos cansados mas curiosos com a estranha cliente. Aquele era o tipo de cliente que se via uma vez na vida: a mulher benzedeira bebedora de cachaça e de pouca conversa.
Alice virou-se e saiu, a sineta tilintando atrás dela mais uma vez. O sol da tarde agora estava inclinado, alongando as sombras dos mourões de cerca pela estrada. A cesta pesava diferente agora: mais leve de documentos, mais pesada de provisões. O trago de cachaça era um nó de coragem queimando em seu estômago vazio.
Ela caminhou com um passo mais rápido, mais determinado. O encontro com Zé Lopes, a transação nos correios, o gole de fogo — tudo isso a reconectava à sua essência mais pura: a sobrevivente. Aquela que negocia, que se disfarça, que bebe a dor para transformá-la em combustível.
No horizonte, avistou a silhueta familiar do caminhão de Nelsinho, estacionado sob a sombra raquítica de um pé de pau-ferro. Ele estava encostado na lateral, parecendo fazer parte da paisagem, fumando.
Ao vê-la se aproximar, ele não sorriu. Mas seu olhar de boi captou a mudança nela. A missão fora cumprida. Ele jogou a ponta do cigarro no chão e abriu a porta do passageiro.
"Dentro," foi tudo que disse.
Alice subiu, colocando a cesta com cuidado entre seus pés. O cheiro do fubá, da carne seca e das ervas agora dominava o interior da cabine, um cheiro honesto de estrada. Nelsinho ligou o motor, e o caminhão começou a rolar, levantando uma poeira dourada no ar da tarde.
Ela olhou pela janela, o povoado desaparecendo atrás deles. Em algum lugar naquela casa de telhado torto, um homem com olhos de coruja começava a bater uma mensagem em código, enviando os segredos mais podres do Brasil através do éter, para o mundo. E em sua cesta, sob a simples janta, havia apenas o perfume do trabalho feito.
O primeiro ato da retaliação estava em movimento. Agora, era hora de voltar para os outros, para a casa de Dona Tonha, e esperar que a tempestade que haviam semeado começasse a mostrar seus primeiros relâmpagos.
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